segunda-feira, 16 de agosto de 2010
Com uma dose de chique e desfaçatez
Em entrevista à edição de Julho/Agosto 2010 da Recursos Humanos Magazine, Catarina Portas explica como surgiu a ideia dos quiosques de refresco e como se gere uma equipa numerosa mas também "dinâmica, cumpridora, implicada, solidária e divertida". Fala de um empenho sem corantes nem conservantes e de "uma missão maior": "contribuir para um país social, cultural e economicamente mais interessante".
Recursos Humanos Magazine: Os negócios têm-lhe corrido de feição. Foi o sucesso experimentado com A Vida Portuguesa que a levou a avançar para o seu projecto mais recente dos quiosques de Lisboa?
Catarina Portas: Quando me surgiu a ideia d’ A Vida Portuguesa, comecei naturalmente a aplicar o mesmo modelo de pensamento a outros temas. Como pegar numa herança antiga e recuperá-la para os dias de hoje? Sempre gostei de quiosques e afligia-me ver tantos e tão bonitos fechados e degradados. Quando a Câmara Municipal de Lisboa colocou a concurso a concessão de três quiosques antigos no centro da cidade, desafiei o João Regal da DeliDelux para este projecto de recuperação. Os quiosques do Largo Camões, Príncipe Real e Praça das Flores foram integralmente recuperados e apetrechados para vender as bebidas frescas tradicionais lisboetas (em vez dos habituais e monótonos refrigerantes engarrafados): a limonada, o capilé, a groselha, a orchata, o leite perfumado. E a ginginha, claro. Sabores próprios e antigos, fresquíssimos, sem conservantes mas bem conservados porque recriados para os dias de hoje. Tudo em louça descartável e biodegradável (copos transparentes em PLA, amido de milho, em vez de plástico). A preços acessíveis porque este é um espaço de todos, com esplanada, para desfrutar sem pressas.
RHM: Como lhe surgiu o conceito dos quiosques?
CP: Sempre gostei de quiosques e causava-me tristeza passar por eles e vê-los fechados, ao abandono. Gosto de fazer este exercício de pegar numa coisa semi-esquecida e perceber como é que se pode adaptar aos tempos de hoje de uma forma interessante, preservando as suas características originais. E achei que seria engraçado recuperar os quiosques, com uma dose de chique e desfaçatez, para a sua função original.
RHM: Qual tem sido a receptividade desta iniciativa?
CP: Tem sido óptima. Recentemente até lançámos um concurso de desenho para comemorar o primeiro aniversário, “Desenha-me um Quiosque”, e fomos inundados de participações, com uma qualidade incrível. E temos tido um óptimo feedback dos clientes, sobretudo das novas gerações que não conheciam muitos destes refrescos. Damos a provar e ficam rendidos.
RHM: Para o lançamento deste projecto, contou com o apoio do arquitecto João Regal. É importante para si firmar parcerias e partilhar os sucessos e eventuais insucessos, tentando, dessa forma, minimizar os riscos?
CP: Acredito que juntos, quase sempre, fazemos melhor. Gosto de trabalhar em equipa, ter alguém com quem discutir ideias e assim enriquecer os projectos. Na marca A Vida Portuguesa e na loja de Lisboa sou totalmente independente, arrisco como quero, faço o que me parece certo, nem que seja apenas por instinto. Tenho essa liberdade e isso é importante para mim. Já a loja do Porto é uma sociedade com a Ach. Brito, uma marca local que admiro infinitamente, exemplar no seu percurso de recuperação recorrendo inteligentemente à sua história e arquivo, sabendo penetrar num mercado de nicho a nível global. Para a loja online fiz uma parceria com uma loja online já existente, a Feitoria, especialmente dedicada ao artesanato. Somos duas lojas gémeas, com o mesmo carrinho de compras e, juntas, temos mais de mil produtos disponíveis. Dividimos os nossos catálogos, não nos concorrenciamos e atraímos mais clientes. Nos Quiosques de Refresco, a parceria é muito complementar. O João Regal é arquitecto, foi ele o responsável pela recuperação e adaptação dos Quiosques. Mas também tinha a experiência do DeliDelux, uma loja gastronómica que inclui cafetaria e isso também foi uma mais valia para o projecto. Quanto a mim, tive a ideia, fiz a investigação, desenvolvi e continuo a desenvolver o conceito, trato da comunicação. Em conjunto, decidimos tudo. […]
RHM: Uma vez que continua a dispersar-se por várias áreas de interesse, é fácil para si gerir uma equipa de mais de 30 pessoas?
CP: Tendo bons gerentes, é mais fácil. Pessoas que compreendem o projecto, que cresceram com ele, que acreditam e se dedicam. Mas nada funcionaria se não fossem os profissionais aplicados que formam as equipas e vestem a camisola. Ou, neste caso, o avental. Sei que muitos dos que trabalham connosco sabem que o seu empenho faz a diferença na vida de muitos outros, aqueles que produzem nomeadamente, e acredito que esse sentido de comunidade é uma motivação forte para todos nós.
RHM: Trata-se certamente de uma equipa jovem… Que tipo de técnicas utiliza para as motivar?
CP: São equipas geralmente jovens, com várias excepções. Hoje, recebemos muitos CVs de pessoas especialmente motivadas para trabalhar nas lojas d’ A Vida Portuguesa e nos Quiosques, por se identificarem com o projecto e o conceito. É meio caminho andado. No recrutamento, privilegiamos pessoas com formação, mesmo que noutras áreas, com interesse, curiosidade e personalidade – muitas nunca venderam coisa alguma. Há quem tenha vindo da área do cinema, do teatro ou das artes plásticas, da antropologia ou do design, das relações internacionais ou da comunicação social. Talvez não fiquem a vida inteira connosco mas, enquanto estão, cada um com as suas características e bagagem específica, são uma mais valia para o projecto. Para mim, o essencial é que entendam a nossa missão maior: fazer com que gostemos dos nossos produtos e, dessa forma, contribuir para um país social, cultural e economicamente mais interessante. Sentirem-se parte de uma equipa dinâmica, cumpridora, implicada, solidária e divertida também ajuda, é claro. Para mim, tem sido uma felicidade conhecer e trabalhar com muitas destas pessoas. Quando nos reunimos no Natal, é frequente que compareçam alguns que já não trabalham connosco mas que ficaram amigas da vida, para além da “Vida”. E isso é bom, muito bom.
RHM: Os seus colaboradores possuem algum tipo de formação específica sobre os produtos?
CP: Claro, isso é indispensável. A nossa principal missão é valorizar os produtos antigos e para isso é indispensável conhecê-los, saber-lhes as histórias e características. Temos materiais informativos, tanto n’ A Vida Portuguesa como nos Quiosques, e pedimos aos novos “recrutas” que os leiam. Sempre que possível também conduzo visitas guiadas às novas equipas. E uns vão passando aos outros a informação. Existe um bom ambiente e espírito de camaradagem nas nossas equipas e isso, para mim, é fundamental.
Nota: as fotografias são de Ricardo Santeodoro, tiradas por ocasião da festa do primeiro aniversário do Quioque de Refresco. Em cima: Catarina Portas e João Regal. Em baixo: parte da equipa dos quiosques.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Ontem no quiosque do Jardim do Príncipe Real, em vez dos habituais copos de amido de milho e de papel, estavam a servir em copos de plástico branco, daqueles que não são biodegradáveis e vão parar direitinhos ao mar. Embora o empregado me tenha dito que era por terem de momento acabado os copos de papel, a julgar pelas pilhas de copos de plástico encima do balcão parece que não se esperava reposição tão cedo. Espero que tenha sido um desliz pontual e não o fim de uma política de negócio pioneira e amiga do ambiente que fazia um dos atractivos maiores destes simpáticos quiosques.
ResponderEliminar